Hoje, há 75 anos…
Hoje, há 75 anos, ocorreu uma operação militar – ímpar até à
data – fundamental para a Europa que somos.
Hoje, há 75 anos, milhares de jovens e menos jovens
atravessaram o Canal da Mancha para dar luta às forças de um dos piores regimes
políticos da nossa História universal. Grande parte desses jovens, se não mesmo
a maioria, nem sequer eram europeus. Parte significativa deles, provavelmente,
nem saberia bem por que iriam lutar (e morrer).
Hoje, espero, não haverá dúvidas sobre as razões da luta.
Tratava-se de eliminar uma ditadura profundamente sanguinária, genocida,
absolutamente desumana, fundada na superioridade de uma ‘raça’ sobre todas as
outras e na ‘obrigação’ de destruir algumas dessas ‘raças’ e escravizar as
restantes.
Esta luta, que escrita parece simples, mobilizou milhões de
pessoas, de dezenas de países, origens e culturas, unidas pelos superior
objectivo de restabelecer a dignidade humana e estabelecer ou restabelecer os
fundamentos da Democracia.
Os que morreram naquele dia nas praias da Normandia são
credores eternos da nossa gratidão e reconhecimento: americanos, ingleses,
franceses, canadianos, australianos, neo-zelandeses, polacos, espanhóis… quiçá
alguns portugueses e muitos outros deram a vida pelo bem supremo: a Paz com
dignidade e em Liberdade.
Ignoro se ainda haverá protagonistas vivos (será difícil,
mas não impossível). Importa pouco quanto à importância das celebrações. Hitler
e o nazismo não foram fruto, apenas, da sociedade alemã (nem da ‘inspiração’
fascista de Mussolini). A ascensão de Hitler teve muito a ver com um misto de
dureza e tibieza dos governantes das ‘potências’ saídas da primeira guerra
mundial: dureza na imposição de ‘reparações de guerra’ desproporcionadas e
tibieza perante os primeiros sinais de agressividade. A ‘expansão’ alemã
deveu-se, em boa parte, à falta de visão e muito egoísmo dessas mesmas
‘potências.
Hoje, é esta a principal ‘lição’ que se deve tirar a
propósito dos desembarques na Normandia. Não é, ainda, um conflito armado que
se pode vislumbrar no horizonte. As sombras que se projectam têm a ver com
justiça, com solidariedade entre os povos e as nações, com respeito pelos mais
pequenos e mais fracos, com a capacidade de ouvir, e entender, os outros.
A multiplicação de fenómenos que, simplisticamente,
‘arrumamos’ como ‘populismos’ e ‘nacionalismos’ é a face visível de múltiplos e
diversos descontentamentos a que devíamos prestar mais atenção. Com menos
intuitos ‘punitivos’ do que com disposição para entender as origens e procurar
‘remédios’.
Na confusão dos anos 20 e 30 do século passado, Mussolini,
Hitler e outros figurões menores prosperaram porque foram entendidos como a
única resposta à desesperança e ao desespero de milhões e milhões de pessoas
comuns.
Hoje, há 75 anos, os desembarques na Normandia aconteceram
porque a força dos Estados Unidos da América veio, pela segunda vez em três
décadas, em socorro da Europa. Sem isso, fosse em 1917 fosse a partir de 1942,
a nossa História seria diferente e dificilmente seria tão boa como, apesar de
tudo, é. Isto devia obrigar-nos, no mínimo, a não ser ingratos (que não,
evidentemente, bajuladores).
As manifestações anti-Trump que vêm pautando estes dias,
mesmo que protagonizadas por uma imensa minoria, são um significativo sinal
dessa ingratidão. Não me interessa que Trump seja um desequilibrado, um tolo,
um impreparado, um ‘seja lá o que for’: Trump é o presidente dos EUA e veio à
Europa (também) a propósito dos desembarques na Normandia e a Europa deve aos
EUA, que não aos seus presidentes, a ajuda decisiva para concretizar tais
desembarques.
Acresce que, num cenário de ‘deslocalização’ da atenção
norte-americana para a zona do Pacífico, é uma péssima ideia dar sinais de que
os norte-americanos não são benquistos na Europa. Se, e quando, voltarmos a
precisar deles…
(a foto é de minha autoria, no cemitério norte-americano de
Colville-sur-mer, em Julho de 2007)
Comentários
Postar um comentário